A melhor contribuição que o Conexão Paris pode dar aos nossos leitores é falar da nossa experiência de vida, minha e da minha filha, um relato sobre como viver com a ameaça terrorista, com a violência tout court.
Como estamos em Paris desde 1983, presenciamos vários momentos tensos e dramáticos como este agora.
Em 1986, vivemos treze atentados (ou tentativas) em Paris com explosões na loja Marks & Spencer do boulevard Haussmann, nas Galeries Lafayette, no Printemps, na livraria Gilbert Jeune no Quartier Latin. O mais grave de todos foi a bomba jogada dentro de um lixo, na rue de Rennes em Saint Germain, provocando a morte de sete pessoas e inúmeros feridos.
Entre julho e outubro de 1995, a França sofreu oito atentados a bomba provocando oito mortos e 200 feridos. O mais grave foi a bomba deixada debaixo de uma poltrona do RER B, na estação Saint Michel Notre Dame.
Os parisienses já têm os reflexos necessários para viver a ameaça terrorista no cotidiano. Assim como nós, brasileiros, dominamos a arte de sobreviver à violência urbana no cotidiano.
A violência existe em quase todas as sociedade, o que muda é sua forma e sua manifestação.
No Brasil temos cercas elétricas, vigias armados, carros blindados, condomínios fechados, elevadores com código, câmeras e alarmes. Os franceses me perguntam assustados como podemos viver diante de tamanha ameaça.
E vocês, agora, se perguntam, inquietos, se vale a pena desembarcar em Paris.
Cedo, o pequeno parisiense aprende a observar se existe algum objeto abandonado nos lugares públicos: ônibus, metrôs, estações, aeroportos. Recentemente, na gare de Lyon, um jovem denunciou, ao gerente da farmácia, uma mala abandonada diante da porta de entrada. Eu estava no interior e acompanhei a chegada dos seguranças e logo em seguida a chegada de um viajante esbaforido dizendo que a mala era dele.
Cedo, eles aprendem também que, apesar de ser necessário estar sempre atento, a vida continua. Ninguém deixa de viajar, pegar o metrô, ir ao cinema, passear nas ruas e parques. Percebo nesta atitude um desafio, uma admirável altivez diante do inimigo. No dia do atentado do Charlie Hebdo, na manifestação da praça da Republique, o maior cartaz dizia: not afraid.
A filha de Wolinski, um dos cartunistas assassinados, no dia mesmo do atentado publicou a foto do escritório do seu pai com a seguinte legenda: Papai partiu, Wolinski não. O pai morreu, mas a causa pela qual ele sempre lutou continua viva.
Ontem, enquanto escrevia este texto, um terceiro atentado estava acontecendo em Vincennes, diante do apartamento da minha cunhada. E, ao mesmo tempo, um amigo do meu marido, por telefone, lhe desejava feliz Ano Novo. E, do escritório, eu os escutava rir e programar encontros futuros.
As ameaças terroristas não deixarão de existir. Mas hoje, Paris está mais preparada, mais bem protegida e mais alerta do que na semana passada. Não desprograme seus encontros futuros. A vida continua.
Descontos e presentes aos leitores do Conexão Paris
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99 Comentários
Evandro Barreto (Dodô)
Excelente depoimento. Sóbrio, informativo, consistente. Que a história supere em breve esta fase sombria.
Christhiane Coelho
Estamos eu e o marido em Paris desde o dia 29/12/2014 e retornaremos ao Brasil daqui há alguns dias! Posso afirmar que a vida continua em Paris. Se percebeu o sentimento de perplexidade e as vezes até uma revolta contida para nossos padrões brasileiros. Os seguranças das lojas, os policiais e as pessoas em geral estão mais atentas. Os turistas que falem o idioma francês ou não continuam ser tratados com a mesma simpatia. Os pontos turísticos, ônibus, trens e metrôs estão funcionando normalmente. Um mais desavisado que não estivesse atento a mídia, passaria até ser saber o que se passou e se passa!!!! Portante, triste, mais a vida segue!!!
Bebel Moraes
linda materia! fiquei emocionadissima!!! Muito orgulho de voces e dos Parisienses. em Fevereiro estarei ai com meu marido e 3 filhos ❤️
Carlos Silva
Parabens pela análise lúcida e objetiva.
Silvana
Lina, concordo plenamente. Seu texto foi muito importante para os turistas brasleiros!
Maria Angela ludolf
Olá Lina. Estou em ZERMATT indo amanhã para Paris. Hospedo-me na Rue de Provence. Vou ter problemas com as manifestações de amanhã. Chego a Gare de Lyon as 17:00. Haverá metro? Aguardo sua orientação, e mais uma vez , obrigado
Rodrigo Lavalle
Maria Angela, infelizmente só agora estou retomando as respostas. Espero que tenha corrido tudo bem.
Abraços.
Juliana
Confiar na proteção de Deus e ser feliz… realizar os sonhos…Paris,”tamo” chegando!!!
Adriana
Se Deus quiser logo…logo estarei ai. E nao esquecam que Paris e forte candidata para sediar as Olimpiadas de 2024. Vai concorrer com Boston, Berlim, Roma e outras que nao lembro agora. Violencia existe em todo lugar. Ate mesmo aqui nos Estados Unidos. Temos 3 ou 4 cidades entre as 30 Mais violentas do mundo, New Orleans, Detroit, Baltimore e St. Louis que o digam. Ontem por pouco quase presenciei um assalto a banco. Nas, nao deixarei de viver por isso.
Juliano Oliveira
É bem por aí… Vida que segue. Viver em qualquer lugar do mundo tem seus riscos e aprendemos a lidar com isso. Hoje estava comentando com minha esposa em visitar novamente Paris. O mundo é pacifico, algumas pessoas não.
Fátima Almeida
Jamais adiaria uma viagem à França por medo de terroristas ou do que fosse. Um dia com certeza vou morrer. Se for em Paris estarei “em casa”. Je suis Charlie.