No rastro de uma brasileira em Paris é uma crônica sobre Eufrásia Teixeira Leite, uma mulher digna de nota.
No rastro de uma brasileira em Paris é também um roteiro turístico intitulado Brasil-Paris.
Por Eneida Queiroz
Conexão. É uma coisa que buscamos em todos os lugares e em todas as pessoas.
Em Paris, cada esquina parece ser um ponto turístico e, por vezes, mais que isso: um verdadeiro ponto de conexão. Para aqueles que gostam de arte e literatura, é comum que façam questão de ir ao café em que Hemingway, Picasso e Simone de Beauvoir costumavam frequentar: o Café de Flore. Já outros preferem visitar lugares onde seus filmes prediletos foram filmados: como o café do filme Amelie Poulain, Les Deux Moulins, em Montmartre. Exemplos assim são incontáveis!
Está chegando a hora de nós, brasileiros, criarmos o nosso percurso de reverência em Paris. As nossas conexões! O livro “A história do Brasil nas ruas de Paris”, de Maurício Torres Assunção, narra a história de vários brasileiros que moraram nessa cidade. Musealizar essas histórias, criando percursos turístico-culturais, como uma visita guiada que mescla céu aberto e interiores, seria muito interessante: um Museu de Percurso Brasil-Paris!
Hoje vamos conhecer Eufrásia Teixeira Leite. Uma mulher digna de nota, que nasceu na cidade de Vassouras em 1850. Herdeira de barões e comissários do café, ela foi uma das primeiras mulheres a se lançar na bolsa de valores! Foi com inteligência financeira que Eufrásia multiplicou por dez a herança que o pai lhe legou. Por estar montada na grana e ter bom gosto, podia dar-se ao luxo de usar roupas de Charles Worth [o criador da alta costura] e encomendava quadros a pintores renomados, como Carolus Duran!
Se fizermos um “Percurso Eufrásia” pelas ruas de Paris, andaríamos por ruas, jardins, museus, lojas, teatros e hotéis.
Venham comigo no rastro de Eufrásia? Vamos começar embaixo do Arco do Triunfo, porque vamos passar na frente da casa de Eufrásia!
O Percurso Eufrásia
1) Bem-vindos ao Arco do Triunfo! Tenham em mente que a Paris que vocês conhecem hoje foi remodelada com a reforma Haussmann em meados do século XIX. Haussmann era o nome do prefeito de Paris entre 1853 e 1870. Ele mandou abaixo a arquitetura medieval que ainda sobrevivia na cidade e construiu grandes bulevares. Como essas 12 avenidas que vocês estão vendo aqui, ao redor do Arco do Triunfo: esse desenho forma um Sol, uma estrela! Por isso esse cruzamento circular onde está o Arco, com seus 12 raios, é conhecido como Place de l’Etoile. Na Champs Élysées, a principal avenida entre os 12 raios, erigiram-se os palacetes que vocês estão aqui vendo. Era chique morar aqui. Se vocês pegarem a calçada da esquerda e forem olhando as fachadas, encontrarão a placa na residência do nosso Santos Dumont, que além de gênio era riquíssimo. E as ruas vizinhas também tinham seu prestígio: peguem a calçada da direita e andem até a loja da Louis Vuitton. Em seguida entrem na Rua Bassano, a rua de Eufrásia, e desçam até encontrar o número 40. Pronto, vocês estão diante de um hôtel particulier, uma casa de vários andares, todos da mesma proprietária.
2) Vamos agora ao Petit Palais! Vamos voltar para a Champs Élysées. Desçam toda a rua até a Avenida Winston Churchil. Virem a cabeça, olhem à direita! Vejam a Ponte Alexandre III lá embaixo, cruzando o Sena e desembocando na Esplanada do Les Invalides! É uma das paisagens mais bonitas da cidade. Entrem na rua! Mas antes de cruzarem essa ponte, a mais bela da cidade, vocêm vaõ entrar no Petit Palais!
Enquanto caminhamos, saibam que essa parte da cidade foi construída para a Exposição Universal de 1900! Se a Torre Eiffel foi o que restou da Exposição de 1889, os presentes da Exposição de 1900 à cidade foram o Petit e o Grand Palais. Além da maravilhosa Ponte Alexandre III, essa presente do Czar russo. O Petit Palais é uma jóia em estilo eclético em voga no período. Estilo que unia classicismo romano, rococó barroco francês, passado gótico e Art Nouveau resultando no luxo louco do fim do século XIX. A colunata interior, ao redor de um jardim aberto em semicírculo, abriga um café extremamente aprazível.
É aqui que vocês encontrarão Carolus Duran, o pintor de Eufrásia! E o melhor? De graça! Sim, a exposição permanente do Petit Palais é gratuita! E exibe arte referente à cidade de Paris, sua história e seus habitantes. É aqui que vocês encontrarão um enorme quadro da atriz Sarah Bernhardt, quadros de Courbet e, claro, alguns quadros de Duran. Ele era o pintor das parisienses de alta renda do século XIX. O famoso quadro de Eufrásia, em fundo vermelho, está em Vassouras, no Museu Casa da Hera, no estado do Rio de Janeiro. Mas o quadro de Mademoiselle Lancey, de 1875, do Duran, está aqui. O detalhe do sapatinho acetinado com fivela e salto de ouro é um mimo luxuoso da senhora deitada e envelopada em sedas e brocados. Já Madame Stern, do mesmo Duran, está toda em veludo vermelho – exemplo áureo do período vermelho do artista, da qual Eufrásia fez parte e ninguém sabe. Está na hora de saber, vocês não acham?! Se vocês quiserem ver mais quadros de Carolus Duran, eu os aconselho o Museu d’Orsay. Lá encontrarão o La dame au gant e o Retrato de Madame Fayedeau.
3) Vamos agora ao Boulevard de l’Opera?! Voltem para a Champs Elysées e sigam até o Louvre. Isso, tirem foto das flores do jardim das Tulherias. Imaginem Eufrásia e Joaquim Nabuco, o galã abolicionista do século XIX, do qual ela foi noiva, passeando de braços dados por entre essas árvores e canteiros floridos. Passem pelo arco do Carrossel du Louvre e entrem na Avenue de l’Opera. Ali vocês encontrarão o Hotel du Louvre, hotel 5 estrelas que existe desde o século XIX e funciona até hoje. Eufrásia já se hospedou aí, assim como outros brasileiros do jet set dos oitocentos. Desçam a rua até o final e entrem na Ópera de Paris para fazerem uma visita guiada: é lindíssimo! Tão famosa e aclamada, que seu projeto serviu de base para o Teatro Municipal do Rio de Janeiro, construído décadas depois, no período das Reformas Passos.
4) Vamos terminar o passeio na Galerie Lafayette? Aproveitem que vocês estão na Ópera para conhecerem a Meca do Comércio de Luxo de Paris. E por mais que não tenham muito dinheiro sobrando, só entrar no prédio para ver sua cúpula de vidro Art Nouveau já vale o passeio. Não deixem de ir ao último andar para terem uma bela vista da cidade. Como Eufrásia era consumidora de roupas do pai da alta costura, Charles Worth, terminar o passeio na Galerie Lafayette é interessante. O título de criador da alta costura é dado ao inglês Charles Worth. Na época, os costureiros só trabalhavam sob encomenda, de acordo com instruções das clientes, e a moda transformava-se de forma lenta. O avançar da industrialização mudou este quadro. Worth foi um dos agentes mais importantes nesse período de mudanças. Uma de suas inovações foi apresentar vestidos prontos. Ele convidava as senhoras da alta sociedade à loja e exibia as roupas no corpo de sua esposa. Depois, passou a contratar outras mulheres para o serviço – e por isso se tornaria conhecido como o criador da profissão de modelo e manequim. Seus vestidos foram os primeiros com etiquetas internas identificando o criador da peça. Ele os considerava como verdadeiras obras de arte assinadas. E Worth inventou, ainda, as coleções por temporada. Eram duas por ano, hoje conhecidas como primavera-verão e outono-inverno.
Um passeio e um mergulho desses é maravilhoso. E terminem-o ainda mais impressionados, ao saberem que essa mulher, que multiplicou por 10 a fortuna do pai, foi noiva, mas nunca se casou e nem teve filhos. Correspondeu-se com Joaquim Nabuco, seu verdadeiro amor, por muitos anos. Não há registros que tenha tido interesse em outra pessoa. Em sua morte, legou quase toda sua fortuna à Instituições de Caridade em Vassouras e até aos mendigos de seu quarteirão em Paris. Hoje sua casa em Vassouras é um museu: Museu Casa da Hera. E alguns de seus trajes Charles Worth estão lá em exposição.
Para quem quiser conhecer mais sobre a extraordinária Eufrásia Teixeira Leite, o Centre Culturel du Brésil está organizando uma palestra com a escritora Eneida Queiroz. A escritora é autora do romance “A mulher e a Casa”, sobre Eufrásia Teixeira Leite e Joaquim Nabuco. A palestra será na Maison de L’Amerique Latine no dia 30 de maio de 2017, às 19:30. Após a palestra, haverá venda do livro, autógrafos e um pequeno coquetel. Estão todos convidados!
Os primeiros 3 leitores do Conexão Paris que enviarem um selfie diante de um desses lugares ou obras mencionadas no Percurso Eufrásia, receberão por e-mail o livro em formato PDF. Email de contato: [email protected]
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7 Comentários
Eneida Queiroz
Os romances já escritos sobre Eufrásia são:
Mundos de Eufrásia – Claudia Lage 2009
A mulher e a Casa – Eneida Queiroz 2013
Um mapa todo seu – Ana Maria Machado 2015/16
Além disso, existem outros que não são romances (não são ficção).
Soraya
Adorei o post e com certeza vou fazer parte do percurso em minha próxima visita a Paris em Abril/2017. Aproveitando, você teriam a indicação de algum site para que eu possa me informar da programação cultural de Paris no período de minha estadia? Obrigada!
Rodrigo Lavalle
Soraya, pesquise no site Sortir à Paris.
Marilita
Poderiam fazer um percurso sobre a estadia de D. Pedro II em Paris.
Rodrigo Lavalle
Marilita, obrigado pela sugestão.
Angélica Monnerat
Lina, boa tarde.Vc conhece o livro da Ana Maria Machafo chamado “Um mapa todo seu”?É justamente a história da Eufrásia e do Joaquim Nabuco.Excelente! Recomendo!bj
Rodrigo Lavalle
Angélica, não conhecemos. Obrigado pela dica!