O melhor canal de televisão da França se chama ARTE. Trata-se de um projeto cultural franco-alemão, um canal sem publicidade e altamente elitista. Os programas são escolhidos a dedo como, por exemplo, documentários culturais e geopolíticos, seleção dos melhores filmes europeus, divulgação de concertos e espetáculos, entrevistas com escritores e intelectuais.
Semana passada, Arte divulgou um documentário ousado e interessante. O título La face cachée des fesses é uma alusão à expressão la face cachée de la lune. A face escondida da bunda/a face escondida da lua. Um documentário que explora, sob todas as formas, a história da representação daquilo que é próprio do homem, ou seja seu “traseiro”.
O documentário cita a famosa frase do filósofo francês Jean Paul Sartre : la patrie, l’honneur, la liberté, il n’y a rien: l’univers tourne autour d’une paire de fesses, c’est tout (a pátria, a honra, a liberdade, nada existe: o universo gira em torno de um par de bundas, e pronto).
Duas considerações. A primeira, a pertinência deste assunto, ou seja, uma reflexão sobre a parte do corpo humana mais representada, mais admirada e objeto de todas as obsessões. Uma história da representação deste objeto nas artes, na literatura, na psicanálise e na filosofia. A segunda, a segurança com a qual os intelectuais franceses são capazes de tratar certos assuntos delicados e limítrofes, para transformá-los em um texto de divulgação para um público abrangente. Analisar a representação das fesses em um colóquio que reúne psicanalistas e críticos de arte, na Escola de História da Arte do Louvre, é um empreendimento sem riscos. Transformar isto em documentário das 20.30h é um exercício que pede um grande esforço na elaboração de conceitos e na escolha das frases e das ilustrações.
Admiro esta segurança dos intelectuais franceses no campo das pesquisas sobre o corpo humano, todavia percebo um contraste entre a abordagem intelectual e a realidade das relações entre as pessoas. A ousadia intelectual é grande, mas sociedade francesa é conservadora.
Descontos e presentes aos leitores do Conexão Paris
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34 Comentários
Cláudia Oiticica
Helena, que sucesso, não? Que pena que não estarei em SP, senão não deixaria de ver o programa. E livro já chegou da Alemanha? bjs.
Cláudia Oiticica
Tomei conhecimento dessa rede de televisão Arte através de uma jornalista francesa que trabalha lá e ela participou como convidada de uma aula na Aliança Francesa. Ela estava no Brasil fazendo um documentário sobre a escassez de água e já estava há algum tempo entre a Amazônia e o nordeste brasileiro. Uma outra coisa que me lembro foi que ela comentou da desconfiança dos franceses quanto a essa parceria franco-alemã na criação do canal Arte devido aos resquícios das cicatrizes entre os dois países, mas que o projeto tinha se revelado um grande sucesso e foi mais uma forma de reaproximação entre a França e a Alemanha.Depois disso, quando estive na França, pude conhecer o excelente nível da programação. Achei o tema desse documentário bem curioso, entrei no site e vi a chamada muito bem produzida. Lina, acho estranho quando você diz que a sociedade francesa é bem conservadora, mas já tinha ouvido isso de um primo meu que mora aí e de outros franceses também, mas de uma maneira geral, a imagem que se passa é a de um povo liberal, talvez pelas referências que conhecemos ao longo dos anos.
Helena Bäuerlein
Gente,
estarei nessa 5a. feira no Bom Dia São Paulo( Globo) às 7 hs da matina, ensinando uma sobremesa natalina. É bem cedo( eles chegam aqui em casa às 5 hs da manhã). Prometo ensinar uma coisa fácil e saborosa (tenho 2 minutos!) para os que madrugarem.
Bjk,
Helena
Guilherme A.
Ou Derrière!
HAHAHA
ORLANDO
SUELI OVB
Sueli, pq b___a?
Vamos voltar ao passado distante em que se “dourava a pílula” usando. por exemplo, “le mot de Cambronne”. para o popular “merde”?
(Desculpe te instigar – risos)
Beth
Lina
Parabéns pelo belo post!
Eu acho que Sartre estava a fim de polemizar e “épater les bourgeois” quando proferiu a célebre frase, risos.
Abs.
Helena Bäuerlein
Lina,
SEm dúvida é de uma ousadia própria dos intelectuais franceses. Gosto desse lado instigador, que nos leva a pensar, diria até a filosofar sobre tais temas.
Sartre, além de filósofo, um poeta às avessas, marcou com suas idéias toda nossa geração. Ele só podia ter sido francês. Não o imagino com outra nacionalidade. Essa frase é antológica.
Mas devo lhe dizer que o que mais admirei nesse Post, foi a sua análise precisa sobre o tema .
Parabéns !!!
Sueli OVB
A frase de Sartre tem um poder de síntese indescritível.
A b___a é a representação do que há de mais primitivo, inerente e motivador no ser humano: o sexo. E ele não possui só uma face oculta; ele é o centro do universo humano, o que faz mover céus e terra, o que tudo atrai e o que tudo desorganiza. Incrível seu poder desagregador e sua capacidade de devastação.
Como diz o Guilherme: um assunto inesgótável, interessante. Para mim, acima de tudo, instigante e complexo.
Belíssima matéria!
Guilherme A.
Esse tipo de comportamento contraditório do ser humano, Lina, pode ser observado em inúmeros aspectos da vida e, com certeza, não é inerente somente aos franceses. No Brasil, essa situação também é corriqueira. Veja-se, por exemplo, o excesso de nudez nos desfiles carnavalescos e a ética cotidiana; a condenação (social) dos corruptos e a reprodução microsistemática dos mesmo atos, dentre outros.
Enfim, é um assunto inesgotável e extremamente interessante. É um tema a ser estudado por inúmeros ramos do conhecimento, principalmente a Psicologia Social, fascinante.
Parabéns pela abordagem!
Abraços-
Lígia
Acho que pode te interessar, tb estou vivendo aqui em Paris.
Abs,
http://ligialana.wordpress.com/