Fico surpresa diante destas pichações inscritas em um muro do Jardin des Tuileries. Os funcionários do jardim estão sempre atentos ao menor deslize dos frequentadores! Como ou autores conseguiram esta façanha?
Me afasto do muro e consigo ler a inscrição: Être etonné c’est un bonheur. O que quer dizer “ficar surpreso ou ser surpreendido é uma felicidade”
Percebo, então, que não se trata de uma pichação, mas de uma obra de arte e que ela faz parte do Festival de Arte Contemporânea de Paris.
Penso na discussão, entre os leitores do blog, sobre arte contemporânea e esta será a minha contribuição para a discussão. Uma das funções da ARTE seria exatamente étonner, surpreender. Quando algo consegue, nos dias de hoje, captar nossa atenção, nos distrair, que felicidade! A arte contemporânea não é bela, ela é, quase sempre, agressiva e longe dos padrões estéticos dos séculos passados. Mas ela surpreende e distrai e être etonnée c’est un bonheur.
A frase inscrita no muro é de Edgar Allan Poe.
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22 Comentários
Cris
Eymard,
Descobri Paris a pouco tempo, mas me apaixonei de cara (acho que com todo mundo é assim!).
Obrigada pelas dicas!
Eymard
Quanto ao tema do post, confesso que tambem eu nao gosto do que se chama de arte contemporanea conceitural. Entrar no Pompidou e ver um iglu branco com uma portinha. Abaixar-se para entrar e, la dentro, encontrar um aparelhinho de som com uma musiquinha bem baixinha??? No entanto, procuro me “permitir” olhar o novo e, se possivel, me deixar “surpreender”. Arte ‘e emocao. Ou ela te diz alguma coisa de cara ou nao diz nada e pronto.
As grandes caretas nas tuilheries, passei por eles, e confesso que me diverti. Nao me choram! Nao achei de mal gosto. Ja quando ‘e algo muito conceitural. Que precisam te explicar…isso ja acho mesmo um lixo. Escritos como se fossem pixacao, tambem me incomodam.
Imaginar, por exemplo, Picasso ao seu tempo. Gaudi ao seu tempo. E mesmo os nossos modernistas….Algumas pinturas do Portinari, certamente, causaram “aflicao” ao seu tempo. A distancia nos permite olhar a arte de forma diferente. O que nos e contemporaneo, que ainda nao compreendemos bem, ‘e que nos deixa mais desconfortaveis.
Isso nao tem nada a ver com a qualidade especifica do que esta aqui retratado. Neste caso, estou de acordo. O meu senso estetico nao me permite gostar.
Eymard
Cris,
quem me dera morar em Paris!! Moro em Brasilia (tambem gosto de morar aqui). Mas adoro Paris. Sempre que possivel nao tenho muita “criatividade”. Marco logo Paris. Para mim nao tem Europa sem Paris e nem EUA sem Nova York. Mas essa ja e outra conexao…..(risos)
Sueli OVB
Robson
Assino embaixo. Você atingiu o alvo. É isso mesmo. Arte não pode ser uma coisa seletiva, muito menos feita para poucos entendedores.
Robson Sabóia
Em arte contemporânea tudo é muito sutil, até o impacto. Pois, o fato de vermos uma parede em Paris pichada ou uma estátua com um pneu é impactante quase como um reflexo, ou seja, é simplesmente visual. Não creio que arte nenhuma possa contentar-se com uma coisa tão banal. Pois se eu pendurasse uma sunga roxa na lança de Joana D’arc seria, também, impactante para o transeunte. Todorov escreveu, recentemente, um pequeno livro notável ” A Literatura em Perigo”, em que acaba por tocar no ponto, que a meu ver, é o mais perigoso das artes contemporâneas: arte para um público formado. Não posso aceitar uma arte assim. Escritos para entendedores, apreciadores… seriam símbolos que nos aproximariam enquanto grupos de “especialistas”. Totalmente absurdo! Tem muita coisa boa (poquíssimas geniais), nas artes contemporâneas. Mas não se pode simplesmente ser cooptado por um “mercado” que vende o contemporâneo. Muitas vezes esses “artistas” só o são por conhecerem as pessoas certas.
Tania Baiao
Para enriquecer ainda mais este debate, indico dois livros muito bons para quem tiver interesse no assunto:
“Desconstruir Duchamp” do nosso maravilhoso Affonso Romano de Sant’Anna e ” Cultura ou lixo?” de James Gardner….
RENATO SAU RIOS
Repararam que o “O” da palavra “bonheur” é a representação de uma bomba ?
Gostaria de fazer uma reflexão neste pequeno ( e bom debate ) sobre a questão manifetação artística x depredação de patrimônio público :
Para quem mora em Paris , talvez a arte estabelecida , consagrada , já faça tamanha parte da rotina que seus habitantes já não têm o mesmo deslumbramento dos turistas e vistantes , como foi o meu caso . Agradeço a Deus por , no dia em que passeei pelas Tuilleries , não ver o parquinho , os monstrinhos nem esta pichação .
Já me bastou o astronauta gigante estirado na Cour Royale de Versailles .
O turista Renato ficou muito chateado coom a quebra do clima “real” , com a esposição de Xavier V. ( com exceção do coche-origami púrpura )
Numa cidade e que respeita tanto seu patrimônio histórico e , por isso mesmo , é admirada em todo o mundo , para quem vem de longe e conferir tudo isso , é um choque ver uma parede pichada num ponto tão central . Como foi ver um pneu de bicleta pendurado numa estátua da República , às margens do Sena .
Claro que Paris tem suas mazelas , como temos , em grau bem maior , infelizmente , nas cidades brasileiras , onde o antigo nem teve tempo de se estabelecer e já foi destruído/deturpado .
Talvez fosse o caso de haver novos locais na cidade onde as pessoas tivessem chance e espaço para se manifetsar culturalmente .
Talvez Paris tenha chegado a um ponto tal de saturação artística e de beleza que parece haver um certo desejo inconsciente , de parte de sua população , de enfeiá-la , de torná-la menos mítica .
É o que penso ……………..
Cláudia Oiticica
Não tem fim mesmo, Marcello. Falando em Marcel Duchamp, ano passado fui à uma exposição dele no MAM, em São Paulo e as reações das pessoas eram as mais contraditórias. Se hoje ele ainda consegue chocar, fico imaginando a revolução que suas “obras” causaram no começo do século passado. Foi uma quebra total de paradigmas. Se tudo se transforma, por que não a arte? A arte evolui e mostra as inquietações de uma época. Os gêmeos grafiteiros Gustavo e Otávio Pandolfo saíram das ruas de SP e chegaram à fachada do Tate Modern. Não podemos esquecer que Manet, Cézanne e outros gênios da pintura chegaram a criar em Paris o Salão dos Recusados e uma das frustrações de Rodin foi ter tentado três vezes ingressar na Escola de Belas Arte de Paris sem nenhum sucesso. Ainda bem que os conceitos mudam.
Juçara
A verdadeira Arte, não uma mera reprodução do real, é plurissignificativa e nos permite várias leituras. Consigo ler essa mensagem grafitada como uma manifestação artística que tem intenção – talvez- de mostrar esse caráter de surpresa estética da Arte, de subversão do estabelecido, do convencional. Nesse sentido, “être etonnee c’est un bonheur”!
Parabéns, Lina, por abrir espaço para a discussão em torno desse tema.
ORLANDO
Especialmente neste caso veio a minha mente o ditado: “muraille, papier de la canaille…”
Òtimo, o blog
abrs