A França chega atrasada na história da liberação do casamento aos homossexuais. A Holanda iniciou o movimento em 2000, seguida pela Bélgica em 2002, Espanha e Canadá em 2005, Africa do Sul em 2006, do México, Suécia e Noruega em 2009, Portugal, Irlanda e Argentina em 2010, Dinamarca em 2012. Sem contar vários estados americanos: Massachusetts, Connecticut, Iowa, Washington DC, Vermont, New Hampshire e New York.
Chegou a hora francesa e o projeto da lei será discutido agora no final de janeiro. Enquanto isso, o debate na sociedade está feroz entre dois campos adversos. A direita, a extrema direita e as igrejas, sejam quais forem, são os opositores mais visíveis. Os partidos de esquerda aprovam a medida.
De uma maneira geral, o casamento entre pessoas do mesmo sexo é aceito por parte da sociedade (60% dos franceses são à favor do casamento). A discussão pega fogo quando as consequências inevitáveis deste casamento entram em jogo e entre elas a adoção, as técnicas de procriação e a mudança da terminologia nos papéis de identidade. A lei estuda a eliminação de referências como “nome do pai“ e “nome da mãe”, referências estas consideradas obsoletas diante da realidade de dois pais ou duas mães.
Dia 16 de dezembro 2012 os que defendem o projeto invadiram as ruas de Paris para uma grande manifestação pela igualdade de direitos.
Dia 13 de janeiro 2013 a manifestação será comandada por todos aqueles que são contra o casamento, a adoção e o acesso às técnicas de procriação.
Tenho discutido com amigos brasileiros sobre as similitudes e diferenças entre brasileiros e franceses nesta questão. Parece que as igrejas no Brasil adotam a mesma posição das igrejas francesas. Tanto aí como aqui, elas são contra. A proposta na França é uma iniciativa do Partido socialista e uma promessa da campanha eleitoral de Hollande. No Brasil, ela não seria uma proposta do PT e sim de uma pessoa, Marta Suplicy. Na França a discussão está feroz ocupando espaço na mídia e nas ruas das grandes cidades. A sociedade brasileira não está tão mobilizada ou o assunto não é prioritário. A França, ao contrário do Brasil, engloba na mesma bandeira casamento homossexual, adoção, técnicas de procriação. Tal atitude é justificada com o argumento: “a realidade é esta aí”. Milhões de casais homossexuais adotam crianças ou procuram técnicas de procriação em países mais liberais. E como a lei não reconhece dois responsáveis do mesmo sexo, muitas crianças se encontram desamparadas diante do falecimento de um dos pais ou uma das mães.
Face às pressões vindas de todos os lados, François Hollande hesita, cede à direita, acode à esquerda. E hoje, um grande político da direita, Alain Juppé, pediu um plebiscito.
Atualização: vários leitores publicaram comentários que explicam e ilustram a questão no Brasil. Não deixem de ler estas apreciações bem documentadas e inteligentes.
Foto: Kátia Becho
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57 Comentários
Tania Baiao
Causa espanto a necessidade de uma questão como essa ainda ser “discutida”no século XXI!!!
Como bem o disse Natalia, criança precisa de pais presentes (não importando o sexo deles)
Ouvir a opinião da igreja é que é sim, um contra senso! Com tantos casos de pedofilia, abusos, etc… seria a única que não deveria opinar.
Jane Curiosa
Me desculpem,mas a igreja devia tratar de seus temas internos,esses, sim,bem mais polêmicos.
Cesar Aragão
É de admirar que a França ainda esteja discutindo isso,ela que sempre foi de vanguarda…
Maria Amélia
Embora no Brasil não haja um projeto de lei autorizando o casamento e a união estável entre pessoas do mesmo sexo, vale dizer que o Supremo Tribunal Federal já tomou a frente do assunto, proferindo decisão inédita, autorizando a união. Assim, hoje, no Brasil, os homossexuais podem sim casar e constituir união estável, por força de decisões judiciais, apoiadas inclusive pela OAB, que até já realizou casamentos homoafetivos coletivos em sua sede da cidade de Santos – SP.
Lina
Maria Amélia
Obrigada por essa informação. São sabia deste apoio do STF e da OAB.
Maurício Christovão
Espero que essa discussão um dia seja considerada uma mera curiosidade. Se duas pessoas querem viver juntas, que vivam!!! O que é melhor? Uma criança ser criada por um casal homossexual ou ficar num orfanato até a maioridade?
Maria do Carmo
Acho que há um engano. No Brasil o casamento homoafetivo nao só é permitido como a adoçao de crianças também. Mesmo com a intolerância da igrejas que nem sem[pre se refletem no pensamentos de seus seguidores. A França e outros países é que estao atrasados nessa questao. É claro que há muito para avançar mas na questao homofóbica mas se caminha…
Lina
Maria do Carmo
Estou aprendendo aqui com vocês que o Brasil está na frente de muitos outros países. Obrigada pela participação.
Isabela Almeida
Acho que o Brasil a discussão existe, sim, só que a manifestação dos brasileiros acontece de maneira um pouco diferenciada de outros países. Culturalmente, não temos uma tradição em manifestação “de rua” (embora isso tenha mudado ultimamente). No Brasil, houve – e ainda há – muita discussão e o fato é que nos estados de SP, BA e AL o casamento civil entre homossexuais (ou homoafetivos) é permitido em qualquer cartório. Em outros estados brasileiros as discussões e manifestações continuam…
Natalia Itabayana | Destino Provence
Parte do argumento de direita que se opõe à adoção e reprodução assistida é sustentado pelo discurso das igrejas em torno da concepção de familia, que deve ser constituida por pai e mãe. Ora, na clinica vemos que não é bem por ai, se assim fosse filhos de pais separados ou filhos que perderam pai/mãe na tenra infância e que, portanto, com eles não tiveram pouco ou nenhum contato seriam certamente sujeitos com disturbios psicologicos, o que sabemos não ser o caso (apesar desse discurso ter sido usado contra o divorcio, quando dele foi questão). Não se trata de pai e mãe pra constituir o sujeito, mas de figuras paterna e materna, que podem muito bem ter lugar no seio de um casal homoafetivo.
Acredito que as diferenças entre esse debate na França e no Brasil relevem do tipo de moral que prevalece na sociedade: o que sinto é que por aqui, a moral da igreja tem menor espaço que no Brasil, onde muitos assuntos são ainda vistos como tabu, como a questão do aborto, por exemplo. Mas acredito que progressos tendo sido feitos no Brasil no que diz respeito ao debate dessas questões, inclusive tenho um colega que trabalha diretamente com esses debates em torno de politicas publicas que visam a igualdade em torno do movimento GLBT, mas o caminho é longo e cheio de pedras, e não é sempre facil despertar reflexão quando os temas são tão delicados.
Sil
Eu tropecei com a manifestação do dia 16 de dezembro no Marais e acabei acompanhando um pouco, fui com eles por um tempinho. Uma passeata alegre, calma e propositiva ao mesmo tempo. E com toques inevitáveis de humor. Saí de lá feliz por ter presenciado isso.
Espero que o Hollande não ceda às forças conservadoras…. e que o Brasil também pegue o tema “à unha”.
Juliana W
Pois é… Algumas estações de metrô inclusive estarão fechadas por causa disso – fiquei um pouco assustada com os números que o site da RATP está dando como previsão, mas vejo isso como um reflexo da amplitude desse debate na sociedade francesa – ao contrário do que acontece no Brasil…